quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Estado tupiniquim


O jornalista e escritor Laurentino Gomes declarou em uma entrevista recente que pretende escrever um último livro sobre história do Brasil, sobre o momento de transição da monarquia para a República. O nome será, naturalmente, 1889. O autor, que ficou conhecido com seu livro sobre a vinda da família real portuguesa para o Brasil (1808) e, agora, com a proclamação da independência (1822), revelou com isso que seu projeto é cria rum trilogia sobre a formação do Estado brasileiro.

Não posso falar muito sobre Laurentino uma vez que ainda não entrei em contato com seus livros, no entanto, seu projeto é extremamente interessante. A formação do Estado nacional é um dos grandes temas de nossas ciências sociais e, como o autor já tem um certo prestígio com o público leigo, essa discussão pode ser melhor popularizada.

O Estado brasileiro, como já vimos em posts anteriores, nasceu de uma forma muito peculiar (segundo o padrão latino-americano), pois se originou de uma aproximação entre a Coroa e a colônia, graças ao contexto de guerra na Europa. Muitos acreditam que essa aproximação evitou que o Brasil se fragmentassem em milhares de pequenas repúblicas, a exemplo de seus vizinhos. Outros ressaltam que essa aproximação criou o germe de uma espécie de cultura da conciliação em nossa política, que sobreviveria até hoje.

Seja como for, mais de 120 anos se passaram e aqui estamos nós, diante desse polêmico (e cada vez mais desprestigiado) aparelho. Há muito ainda que ser dito (e lido) sobre a formação do Estado brasileiro, esperamos que Laurentino contribua com isso.

sábado, 16 de outubro de 2010

Alegria e Melancolia

Menino com pião, Portinari.
Numa terra radiosa vive um povo triste. Assim começa o livro de Paulo Prado, Retrato do Brasil, com o revelador subtítulo de Ensaio sobre a tristeza brasileira. O autor considera a melancolia um traço cultural nos legado pelos colonizadores, mas não só ela: a sensualidade e a ambição. Dois fatores que direcionaram nossa colonização e hoje fazem parte de nossa mentalidade.

Paulo Prado
Prado não foi o primeiro a tentar explicar nossa singularidade e encontrá-la em nossas emotividade, nem será o último. Na mesma época ainda persistia a idéia de que o brasileiro diferia do europeu por conta de sua preguiça inata e sua obscenidade, fruto, talvez, do clima tropical. Gilberto Freyre, em Casa grande e Senzala, tenta nos dar uma explicação mais pontual ao dizer que o brasileiro era único por causa de preservar as diversas culturas, as diversas emoções, com uma certa moderação. Esse fator, chamado por ele de antagonismos em equilíbrio, seria responsável pela intimidade entre o senhor e o escravo. Freyre, nacionalista, vê isso com orgulho, enquanto Sérgio Buarque de Hollanda enxerga nesse traço um de nossos maiores obstáculos para a modernização. Em Raízes do Brasil, Sérgio critica essa cordialidade brasileira, essa passionalidade que leva ao patrimonialismo, á corrupção, ao jeitinho. Se o Brasil quisesse se modernizar e acabar com esses problemas teria que saber usar a impessoalidade.
Nas décadas seguintes (Prado escreveu seu livro em 1928, Freyre em 1933 e Sérgio Buarque em 1935) as emoções saem um pouco de lado para cederem lugar a um novo paradigma: a estrutura social. O Brasil passa a ser explicado pelo seu subdesenvolvimento, pela sua economia. As interpretações que levam em conta essa emotividade voltam a partir dos anos 80 quando a história cultural entra no Brasil. Essa geração é responsável por reabilitar Freyre ao chamar a atenção para o antagonismos em equilíbrio (sem usá-lo como argumento para a democracia racial). Alegre ou triste, o brasileiro é único não só pelo conjunto de emoções presente em nossa cultura. Nossa singularidade não precisa ser necessariamente uma, mas várias.